terça-feira, 3 de dezembro de 2019

Entretenimento Digital: Produção em Massa para Consumo Individual e Personalizado

Entretenimento Digital: Produção em Massa para Consumo Individual e Personalizado
Entretenimento Digital: Produção em Massa para Consumo Individual e Personalizado
Nos últimos anos, a disrupção tornou-se o novo normal. Atualmente, ela é impulsionada por uma transformação digital (#DX) com diversas origens, podendo surgir a partir de novos modelos de negócios, startups e até mesmo de novos marcos regulatórios, trazendo inovações e gerando mudanças em todos os ambientes, das empresas em que trabalhamos às nossas residências e espaços de lazer.

Rapidamente, as tecnologias emergentes vêm assumindo o papel de novas janelas da realidade em todas as dimensões de nossa vida cotidiana. Todavia, seu consumo ainda é uma questão de opção, ou seja, apenas os indivíduos e organizações que abraçarem as inovações, ao invés de rejeita-las, colherão os benefícios da disrupção digital.

Estamos atravessando uma transformação fundamental na forma como vivemos e trabalhamos, pois a velocidade e intensidade de mudanças da atual onda de transformação digital causará impactos em uma escala sem precedentes. A #DX é tão abrangente e profunda, que a própria natureza do trabalho está sendo redefinida, assim como o conceito de força de trabalho e os de descanso ou lazer.

Para o bem ou para o mal, os avanços na forma como o conteúdo é criado, gerenciado, armazenado, compartilhado e consumido por indivíduos e empresas, criaram uma gama avassaladora de oportunidades e ameaças para as pessoas e organizações.

Evidências e Impactos Recentes da Disrupção Digital

·      Assistente Digital: Se por um lado, Assistentes Digitais, baseados em Inteligência Artificial (IA), como Amazon Alexa Echo e Google Home, invadem nosso dia a dia doméstico, revolucionando a forma com que lidamos com nossos próprios lares, por outro lado, as previsões do Gartner indicam que, já em 2020, 85% das interações de eCommerce não envolverão de um atendente humano, mas sim um chatbot;
·      Wearables: O Apple Watch, relógio inteligente de maior sucesso no mundo, não apenas superou o tradicional Rolex como a marca de relógio de pulso mais vendida da história, como suas vendas anuais já superam a soma das vendas de todas as demais marcas de relógio de pulso. Além disso, para 70% dos mais de 12,2 milhões de usuários (2018), o smartwatch da Maçã foi o primeiro relógio de pulso de suas vidas;
·      Connected Cars: Quão distantes estão os futuros carros totalmente autônomos? Qual será seu efeito prático na vida das pessoas? Qual será seu impacto na maneira como vivemos, trabalhamos, interagimos socialmente e cuidamos de deficientes e idosos, quando nossos veículos puderem se auto conduzir com segurança de um ponto a outro? Máquinas que executam ações inteligentes sem supervisão humana são um dos sonhos de longa data da #IA e estão rapidamente se aproximando da realidade.

A quantidade total de dados trafegados na Internet em 2022, 4,8 Zb (Zettabytes ou 1021 bytes), será maior do que a soma de toda a informação que circulou desde os primórdios da rede até 2016. Este marco será atingido graças, entre outras coisas, ao forte aumento da quantidade de dispositivos conectados à Internet das Coisas e à geração e consumo massivo de conteúdo digital na atual era da informação.

Diante deste boom de crescimento na geração de conteúdo na Internet, surgem diversos novos questionamentos, uns dos mais imediatos seria como se passou a consumir conteúdo atualmente? Mais especificamente, como e onde se acessa o conteúdo que mais consome banda de rede hoje, ou seja, a multimídia e o entretenimento digital?

Caso esta pergunta seja feita a 20 pessoas diferentes, é muito provável que se obtenha 20 respostas diferentes, mesmo que algumas destas pessoas morem sob o mesmo teto. Por exemplo:

·      Um dos pais pode assistir ao primeiro episódio da temporada final de Game of Thrones em uma televisão de 60 polegadas no domingo à noite, data e hora de seu lançamento oficial na grade da TV por Assinatura;
·      O outro pai pode assisti-lo no final da noite via aplicativo HBO Go em um tablet;
·      O filho adolescente pode deixar para ver no dia seguinte em seu smartphone, ao mesmo tempo em que joga um videogame;
·      Finalmente, a filha, que chegou tarde da universidade, pode fazer o download e assistir o episódio em seu laptop dias mais tarde.

Ou seja, os consumidores estão abraçando as novas oportunidades para desfrutar cada vez mais experiências multimídia adaptadas exclusivamente às suas preferências, contextos e horários pessoais. Cada vez mais móveis e menos ociosos, os consumidores de todo o mundo querem exercer maior controle sobre como e quando consomem seu entretenimento digital.

Eles fazem isso centralizando seu consumo em smartphones, além de uma gama crescente de diversos outros dispositivos acessórios onde organizam suas playlists de filmes, músicas, podcasts e demais fontes de conteúdo. Por fim, novas e ainda mais imersivas experiências de consumo de entretenimento digital estão surgindo, nos envolvendo de conteúdo em nossas casas inteligentes e carros conectados.

O tema central desse enorme e crescente mundo da mídia se foca na demanda cada vez maior de digitalização e individualização. Vivemos a dicotomia do conteúdo que é produzido para a massa, porém minerado pelo indivíduo para seu consumo personalizado e individual. Assim, as empresas estão sendo obrigadas a adaptar suas ofertas e modelos de negócio para girar em torno de preferências pessoais, cruzando dados e descobrindo padrões de uso para entregar seus produtos não para audiências de bilhões, mas para bilhões de indivíduos únicos.

As maiores plataformas de mídia na nuvem atendem e antecipam as necessidades pessoais dos usuários com playlists e recomendações ativadas por algoritmos de Inteligência Artificial. Por outro lado, inseridas em nossos lares, ninguém conhecerá melhor os desejos dos consumidores do que as Assistentes Digitais, pois ouvem e atendem todas as demandas e solicitações de seus proprietários, desde a previsão do tempo, passando por suas compras e refeições, até suas séries de TV, filmes e músicas preferidas.

Trata-se de um mundo em que tudo converge para o consumidor e sua experiência individual. Mas também é um mundo de divergências tanto no nível individual quanto no global. A personalização é o oposto da padronização, o que significa que a experiência de todos com uma música específica, filme ou jogo é única e pessoal.

Vivemos a transição entre a Era da Informação para a Era da Recomendação.


Assim como as demais técnicas de Inteligência Artificial e Aprendizado de Máquina, um Sistema de Recomendação faz previsões sobre preferências com base em comportamentos, experiências e interesses dos usuários. Resumidamente, os Sistemas de Recomendação utilizam basicamente duas abordagens de predição, ou seja, a Filtragem Colaborativa e a recomendação Baseada em Conteúdo.


A abordagem Baseada em Conteúdo recomenda itens a partir da correlação de metadados do conteúdo com as informações de interesse que o usuário informou em seu cadastro no sistema. Este tipo de recomendação requer assim uma grande quantidade de informações acerca dos usuários e dos itens de conteúdo. Neste caso, se o conteúdo em questão for composto por filmes, por exemplo, os atributos serão seus dados sobre gênero, faixa etária, país e ano de produção, diretor, elenco etc.

Já a Filtragem Colaborativa, por outro lado, não utiliza metadados de conteúdo, baseando-se apenas no histórico de preferências dos usuários, recomendando itens semelhantes aos que foram bem avaliados pelo próprio usuário, ou bem avaliados por usuários com perfis semelhantes ao do usuário alvo. Neste caso, a principal suposição aqui é que os usuários que consumiram um conteúdo no passado tendem a consumir algo similar no futuro. Em termos de preferência do usuário, geralmente é expresso por duas categorias, ou seja, Classificação Explícita e Classificação Implícita.
A Classificação Explícita se baseia na avaliação (escala de 1 a 5 estrelas) atribuída pelo próprio usuário ao conteúdo. Trata-se do feedback direto dos usuários referente às suas preferências sobre um determinado conteúdo. A Classificação Implícita, por sua vez, supõe a preferência dos usuários indiretamente, com base nas visualizações de página, cliques, registros de compra, consumo de um conteúdo similar, etc.


Enquanto a Recomendação Baseada em Conteúdo apresenta limitações como a superespecialização e a análise limitada de conteúdos, pois um sistema puramente baseado em conteúdo é incapaz de recomendar itens que não tenham alta similaridade com o perfil do usuário. Por outro lado, a Recomendação Colaborativa enfrenta problemas para analisar usuários recém-chegados ou itens de conteúdo cadastrados recentemente, situação conhecida como Cold Start ou partida a frio. Ou seja, todas as técnicas de recomendação ainda esbarram, em algum grau, na atual baixa maturidade da análise semântica disponível atualmente no mercado.

Uma terceira e mais recente abordagem de recomendação, a Baseada em Conhecimento, busca mitigar a fragilidade das abordagens de classificação e relacionamento de conteúdo acima, que se baseiam principalmente em aspectos sintáticos dos conteúdos tratados. Esta ferramenta de recomendação inova a partir da incorporação de elementos semânticos nos processos de indexação e relacionamento de conteúdo, ficando imune ao problema relacionado ao Cold Start.

Apesar de bons resultados observados por essa ferramenta, ainda são identificadas necessidades de aprimoramento, tanto nas atividades de classificação dos conteúdos, como na representação e tratamento dos relacionamentos entre conteúdos e possíveis interessados. Além disso, a desvantagem correspondente a esta abordagem é representada pelo gargalo em potencial na aquisição de conhecimento, desencadeado pela necessidade de definir o conhecimento da recomendação de maneira explícita. Um exemplo prático de serviços que utilizam a recomendação Baseada em Conhecimento é a busca avançada do IMDb (Internet Movie Database - www.imdb.com/search/title), onde o cinéfilo determina os parâmetros da pesquisa a fim de que o sistema retorne os filmes e séries de TV similares, registrados em seu banco de dados.

Um exemplo de algoritmo utilizado para recomendação é a rede neural utilizada pelo YouTube, que considera inputs como características do vídeo, conteúdo, tópico, tempo de upload, bem como características do usuário, tempo, perfil, cliques, comportamentos, satisfação, likes, etc, utilizando um mecanismo de ranking para sugerir mais conteúdo, como mostra a figura a seguir:

Figura 1. Rede Neural do algoritmo de recomendação do YouTube, publicada no paper: Recommending What Video to Watch Next: A Multitask Ranking System (Google)


Todavia, embora esse novo mundo onde a mídia é individualizada esteja envolvendo o consumidor, a mudança de foco do “um bilhão” para foco nos “bilhões de uns” ainda não está completa. A PwC, por exemplo, publicou em seu Global Entertainment & Media Outlook 2019-2023 que os consumidores ainda estão insatisfeitos com as recomendações de seus serviços de streaming. E o pior é que, ao invés de evoluir, a previsão é de um possível retrocesso nos sistemas de recomendação, pois novos desafios relacionados ao tratamento e a propriedade de informações pessoais estão sendo criados por reguladores em todo o mundo, pressionando as empresas a se adaptarem a novos regimes de privacidade. Ou seja, é possível que questões relacionadas à segurança e a privacidade dos dados pessoais limitarão a capacidade das empresas de entretenimento e mídia de individualizar a experiência da mídia no futuro.

Finalmente, a aplicação de algoritmos preditivos e Inteligência Artificial na recomendação de conteúdo tem um enorme potencial, mas os consumidores, o mercado e os reguladores precisam agir com cuidado, a fim de equilibrar os benefícios da recomendação individual versus o direito à privacidade e à propriedade de Dados Pessoais. Ficando atentos aos seguintes conceitos:

·      Proteção de Dados Pessoais [com moderação]
·      Orientação às Empresas para Inovar com Responsabilidade
·      Incentivo à Criatividade e à Inovação
·      Constante Conquista e Manutenção da Confiança dos Cidadãos

Ou seja, não podemos permitir a hiper-regulação, nem deixar o mercado totalmente desregulado a fim de evitar abusos contra o consumidor, por parte de grandes grupos econômicos e BigTechs.